Apologia e ligação com CV: entenda situação criminal de Poze de Rodo
Poze do Rodo mobilizou o mundo artístico após ser preso na última semana por suspeita de apologia ao crime e ligação com o Comando Vermelho
atualizado
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Um dos nomes mais conhecidos do funk brasileiro, Poze do Rodo — nascido sob o nome de Marlon Brendon Coelho Couto — mobilizou o mundo da música após ser preso na última quinta-feira (29/5). Ele foi detido por suspeita de apologia ao crime e ligação com a facção criminosa Comando Vermelho (CV) e foi solto nessa terça-feira (3/6).
A prisão do MC gerou controvérsias: alguns concordaram com a medida, enquanto outros criticaram e levantaram questões como racismo e a marginalização do funk. O caso foi amplamente divulgado na mídia e nas redes sociais, ganhando proporção nacional.
De acordo com a acusação, o cantor é visto com frequência em festas realizadas por membros do CV dentro de comunidades como o Complexo do Alemão e a Cidade de Deus, sempre com um arsenal de fuzis sendo exposto em meio à multidão.
As músicas de Poze também levantaram debate sobre apologia ao crime. O cantor é conhecido por letras cruas e diretas sobre a realidade da vida periférica do Rio de Janeiro.
O que é apologia ao crime e qual o limite da liberdade de expressão
Em conversa com o Metrópoles, o advogado Glauco dos Reis Silva, especialista em direito penal do Milk Advocacia, “apologia não é o mesmo que narrar vivências ou [fazer] críticas sociais”. O ato pode levar à pena de três a seis meses de detenção ou multa.
“Para que haja crime, é preciso haver exaltação pública e intencional de um crime ou criminoso como algo positivo“, ressalta. Ele destaca que a Constituição garante liberdade de expressão artística e de pensamento, mas ela não é absoluta.
“Quando a expressão estimula práticas criminosas, exalta organizações como o CV ou naturaliza o tráfico, pode ser enquadrada como apologia. A jurisprudência é criteriosa: apenas a menção ou referência não configura crime. É necessário haver clara exaltação ou incitação”, completa Silva.
Sobre a suposta participação de Poze em festas promovidas pela facção, o advogado destaca que, se for comprovado que os shows foram financiados com recursos oriundos do tráfico de drogas, isso, em tese, pode caracterizar os crimes de lavagem de dinheiro (pois o valor ilícito estaria sendo “lavado” por meio da contratação de eventos culturais) e associação criminosa (se houver indícios de vínculo estável entre o artista e o Comando Vermelho).
“Não é crime cantar em baile, mas receber verbas de facção criminosa com ciência da origem pode configurar colaboração com a atividade criminosa, sendo ônus do Ministério Público comprovar o vínculo, a ciência da origem e o dolo na atitude”, explica.
Poze pode processar o Estado do Rio de Janeiro?
A maneira como foi conduzida a prisão de Poze do Rodo foi bastante comentada nas redes sociais. Fãs e famosos — incluindo MC Daniel, Filipe Ret, Oruam e até mesmo a deputada federal Erika Hilton (Psol-SP) — criticaram a conduta dos investigadores.
De acordo com Glauco dos Reis, Poze pode processar o Estado do Rio de Janeiro alegando excesso ou abuso policial, uso indevido de algemas sem justificativa e abuso de autoridade.
Caso as alegações sejam comprovadas, o funkeiro pode receber indenização por danos morais e materiais. “Ainda que a prisão tenha sido autorizada, a forma como ela é executada importa juridicamente”, ressalta o advogado.

Poze do Rodo foi solto: o que acontece agora?
Na última segunda-feira (2/6), a Justiça do Rio de Janeiro concedeu habeas corpus a Poze do Rodo. Na tarde dessa terça (3/6), ele deixou o presídio localizado no Complexo de Gericinó, em Bangu. A liberação do cantor, no entanto, não encerra o processo.
“A partir de agora, ele responde em liberdade, mas com eventuais medidas cautelares, como não sair do país e não frequentar determinados locais, que foram definidas na decisão”, explica Glauco.

O advogado ressalta que o histórico de envolvimento anterior com o tráfico de drogas pode interferir de algumas formas no processo contra o funkeiro.
“Se ele já foi condenado, pode ser considerado reincidente, o que agrava eventual pena. Pode influenciar o juiz na dosimetria da pena, mesmo que o caso atual seja julgado isoladamente, e também pode influenciar na decisão sobre medidas cautelares (prisão preventiva ou não).”
Entretanto, ele ressalta que “antecedentes por si só não provam culpa no novo caso”. “A condenação só pode ocorrer com base em provas do novo processo, respeitando o devido processo legal e a presunção de inocência”, finaliza.